sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Whisner Fraga

Recebi nesta semana o livro "Moenda dos silêncios", escrito a quatro mãos por Ronaldo Cagiano e Whisner Fraga. O livro é um misto de romance e de crônica biográfica - eu acho, pelo que conheço unilateralmente da Ronaldo Cagiano. Da parte de Whisner Fraga, não sei, pois nunca nos encontramos. O livro perpassa pela trajetória crítica à indiferença cultural da população.
Os dois autores são generosos em suas relações com a literatura brasileira.

Aproveito para registrar aqui a resenha que Whisner Fraga publicou noa folha "Brasília Literária", de novembro de 2002, pela oportunidade do lançamento do meu livro "Estoque de relâmpagos".

A resenha generosa:



À ESPERA DOS TROVÕES
Whisner Fraga

           Há algo nos justos que os faz temerem a condição humana e, mais do que predileção, admiro os autores que enobrecem a própria raça expondo o que de mais atroz existe nela. Salomão Sousa disseca sentimentos em Estoque de relâmpagos.  Já os laços do amor atacam/por todos os flancos/deixando apenas o esmo cheiro de fezes. Entretanto, é próprio dos que descobrem nossa decrepitude, temessem uma punição, representarem um bocado de esperança. Ainda que o mar seja uma rocha/ e no deserto o coração vá navegar/ Ainda assim o faroleiro acenderá.
           E não é de se estranhar que o autor não utilize nenhuma pontuação. Vírgula, ponto? Nada. Tal atitude, a meu ver, vai além da ousadia linguística (que por si só justificaria a opção), tendo raízes mais intrincadas, é que Salomão nos apresenta apenas um de seus depósitos, que não tem início nem fim e, apesar de muito provável tenhamos mais adiante uma outra carga, o que não importa, o poeta quer que visualizemos apenas esse clarão, estivéssemos numa desolada cegueira e precisássemos desse rasgo de luz para enxergarmos a possibilidade de uma verdade.
           Quando surgir o lampejo que nos fará, quem sabe?, mais cientes de nosso estado, Todos sentados no baldrame/ à espera de quem desleitere/ os úberes dos gritos. É urgente a descoberta e por isso o tempo presente em todo o livro, mal damos um passo rumo à outra frase e o encontramos, em sua vigília tácita e ímpia: Estou repetindo com a sede da ampulheta; Para atraso de qualquer prazer; O tempo dura apenas/enquanto a lagarta tece e poderia citar muitos outros casos. E não é um dos grandes desejos do homem domar um relâmpago? Usar essa efeméride em seu favor?
           E nos importa de que material esta luminosidade? De sóis: Ressequido fervor de sol/ e outros ainda dirão que é grito. É um a lua/ que vem tarde para a rua. De fogos: Ardência de fogo nas carnes/ e dirão que é podre a lenha do grito. Importa de onde vem a ajuda? Salomão Sousa nos ensina que não. Ainda assim é o amor à justiça, não é desse antagonismo que é feito o bem e o mal?, Quem escolheu o Mal/ escolheu mal. E também não tem o relâmpago e toda a natureza do que é mais forte uma aura de divino? É só essa força que pode Impedir a tempestade/ para não ser a lasca/ o batente arrancado/ de uma porta. A própria dualidade do homem, a chuva ao mesmo tempo ajuda e desgraça.
           Livro que mereceu o prêmio Bolsa Brasília de Produção Literária 2001. Conheci dois premiados até agora, os contos reunidos em Dezembro indigesto, de Ronaldo Cagiano, e estas poesias de Salomão Sousa. Que falta faz um selo para lançar para o resto do país essas duas obras!
           E o homem é forte em sua capacidade de resistir, adaptar. Assim, o poeta termina seu livro: Estarão sólidos os nossos punhos/ e não adianta as algemas descerem/ com a rota euforia de suas sarjetas/ Desastre algum nos tingirá de lama.

Um comentário:

Cris disse...

Gostei muito do Safra Quebrada e agora ao ler a resenha fiquei curiosa sobre o Estoque de relâmpagos.